domingo, 1 de maio de 2011

Limites da Obsessão [Parte 4 - FIM]

Jelle saiu pela porta, fechando-a atrás de si com um estrondo… Sentei-me no sofá, estática… Sem uma única reacção. Parecia que me tinham arrancado o coração ou qualquer capacidade de sentir… sim, tinham-me arrancado o coração e tinham-no pisado! Atirado contra uma parede… Tinham-no queimado… Tinham feito todo o tipo de barbaridades com ele… Depois devolveram-mo… Mas ele já não era o mesmo… Tinha tantas cicatrizes, ainda sangue saía pelos cortes… Ele voltou feito num farrapo… Aliás… nessa altura questionei-me se o meu coração teria mesmo voltado… Se não teria ficado com o Jelle, para ele na primeira oportunidade o deitar fora… Tentava pensar racionalmente mas nada parecia resultar. Mas quem era ele para me rejeitar daquela forma? Encostei-me para trás e fechei os olhos… Relembrava toda a alegria que tinha sentido quando o encontrei no meu regresso para Amesterdão, o quão chegados éramos e o quando chegados estávamos. Se ao menos a Lori não existisse… Se ao menos a Lori não existisse… Fiquei presa nesse pensamento, continuava a questionar-me como teria sido as nossas vidas se ela não existisse, se tivesse ficado em Espanha e nunca tivesse entrado na vida do Jelle… Nessa altura comecei a cometer o maior erro que podia ter feito. Na minha cabeça a culpada de toda a situação era ela, culpava-a por todo o mal que me tinha acontecido, culpava-a por o Jelle não estar comigo, culpava-a por ter entrado na nossa vida… “Mas que vida?” pensei eu… Quem queria enganar? Jelle tinha razão, nunca houvera um Nós…
Agora consigo ver o quão errada estava, consigo aperceber-me do mal que fiz a toda a gente e penso que o melhor seria mesmo se eu não tivesse entrado na vida deles… Existem muitos dias de que me arrependo, muitos caminhos que mais tarde teria preferido não escolher, mas nunca me arrependi tanto de uma acção que parecia tão natural e justa.
Levantei-me do sofá e apressei o passo até ao meu quarto, abri o cofre e tirei de lá a arma que o meu pai me tinha dado, era uma brilhante Ares Light Fire 70, bonita, praticamente nova… Possuía apenas duas balas… Escondia nas calças e saí de casa…
Sinceramente dava tudo para apagar esse dia, vi a raiva na cara do Jelle, a raiva dele, o nojo que ele sentia… Consegui sentir isso tudo quando ele soube da situação e me foi confrontar… Afinal de contas perdi-o na mesma, tudo foi em vão pois talvez não estivéssemos destinados a estar juntos… Mas ele e a Lori estavam, eles estavam tão felizes, tão sorridentes… Demorou-me bastante tempo para aceitar tudo o que tinha acontecido, os meus erros, a efectivamente admitir que tinha errado, pois na minha cabeça eu apenas estava a castigar a causadora de toda a minha dor, esquecendo-me que se calhar a única causadora do meu sofrimento era eu mesma… Custou-me admitir que no fundo se calhar teria só inveja da felicidade que ambos partilhavam… Aquela felicidade que se sente quando se encontra aquela pessoa especial com quem queremos passar o resto da nossa vida! Se calhar apenas tinha inveja de eu ter de refazer a minha vida após uma temporada fora e ele já ter a dele feita… Se calhar tinha medo de falhar ao refazer da minha vida…
A única coisa que tenho a certeza, que me é tão clara como água, é que nesse dia eu preferiria ter gasto as duas balas comigo e não com a Lori…

Limites da Obsessão [Parte 3]

-Quando tempo falta para a Lori se ir embora? – Senti o coração dele dar um pulo.
-Embora? – perguntou ele como se tivesse sido apanhado de surpresa.
-Da nossa vida… - A voz falhou-me. – Para finalmente ficarmos juntos. – respirei fundo, não conseguia bloquear aquele sentimento de arrependimento que me começava a toldar o pensamento.
-Aaghie…- murmurou ele – Acho que precisamos de esclarecer umas coisas. – a voz dele tinha mudado de tom e os seus braços já não estavam a minha volta, o medo começou a apoderar-se de mim… Ele levantou-se e fitou-me enquanto eu permanecia gelada no sofá. Tinha um pressentimento estranho, um nó no estômago que me indicava que algo estava errado.
-Eu não vou deixar a Lori. – disse ele firmemente, como se estivesse absolutamente certo daquilo que queria.
-Não vais agora certo? Mas mais tarde… Talvez quando perceberes que só queres estar mesmo comigo e q-q-quando ela voltar para Espanha… - comecei a gaguejar, a tremer… Estava a começar a ficar desorientada, com a racionalidade toldada.
-Não! Não vou deixá-la!
-Mas porquê? – gritei eu, não consegui evitar ficar exaltada. – Que tem ela de tão importante para ti? Que é que ela tem que eu não tenho Jelle?! Diz-me! – tremia cada vez mais, já me tinha levantado do sofá num ímpeto de raiva, para ficar mais ao nível dos olhos dele.
-Tu é que não consegues perceber as coisas! Não consegues distinguir algo sério de algo que é apenas por diversão! Lê os meus lábios Aaghie! Eu não vou deixar a Lori! Muito menos por causa de ti!
-Mas tu disseste-me… Tu prometeste-me! – os meus olhos começaram a encher-se de lágrimas. – Tu prometeste Jelle! – gritei sem pensar.
-Eu nunca diria isso! Nunca! Por isso pára de me tentar manipular com os teus jogos! – a voz dele elevara-se acima da minha, eu esforçava-me para segurar as lágrimas. O meu cérebro estava completamente bloqueado e não conseguia raciocinar correctamente.
-Disseste na outra noite… - murmurei fitando o chão.
-Provavelmente estava bêbado Aaghie! Mas será que tu não percebes? – Jelle gritou olhando-me nos olhos. Não consegui conter mais as lágrimas.
-Não! Não! Não estavas! – recusava-me a aceitar. – Disseste que me amavas! Nós estávamos juntos e tão felizes! Porque é que mudaste de repente?
-Nós? Nunca houve um Nós para começar… E estávamos bem até começares com a tua paranóia e as tuas obsessões doentias! Elas destruíram tudo o que eu sentia ao estar contigo! Alegria, prazer, mas uma coisa te garanto… Algo que nunca senti foi amor! Até a última réstia de amizade que eu tinha por ti conseguiste sufocar! – duas grossas lágrimas escorreram-me pela cara, os olhos dele trespassavam-me quais navalhas afiadas, sentia toda a sua raiva, a sua frieza… nada conseguiria trazê-lo de volta… - Aaghie… Eu e a Lori estamos noivos…
Num ápice senti todo o meu mundo a desmoronar-se como um castelo de areia levado pelo mar. Parecia que tinha levado um balde de água fria com o balde e tudo… Senti-me bloqueada, sem reacção… Só queria esconder a cara e chorar. Sinceramente não queria acreditar que isto estava a acontecer, sentia-me tão usada, tão magoada…. Senti a raiva dominar-me, já não estava em mim… Fiz uma pausa, ponderei no que ia dizer, respirei fundo.
-Então diz-me amor, meu querido, que diria a tua noiva se de repente descobrisse que tu tinhas outra namorada? – não pude evitar sorrir maliciosamente, estava tão cega pela rejeição que já nada me interessava.
-Tu não és, nem nunca foste minha namorada! – gritou ele com os olhos em chamas. – Aaghie digo-te uma última coisa… - Ele caminhou para a porta e abriu-a. – Se me estragares o casamento… - murmurou ele. – Eu mato-te! – Jelle preparou-se para sair.
-E se eu te matar primeiro? – murmurei num tom de voz doentio.

Limites da Obcessão [Parte 2]

Quando dei por mim já a garrafa jazia ao meu lado no sofá, tombada para o lado, enquanto eu dava o último gole de vinho esperando desesperadamente que tal bebida limpasse a minha frustração obstinada. Perguntava-me, naquele preciso momento, a razão da existência de Lori na vida dele. Porquê? Nós podíamos ser tão felizes se não houvesse aquela rapariguinha no meio! Aquela criatura de palmo e meio que gostava muito de brincar as senhoras crescidas, erguendo-se nos seus saltos altos de 10cm quando ela própria não media mais de metro e meio. Usava o seu cabelo preto escorrido com uma franjinha de boneca sobre os olhos… Começava a sentir as pálpebras pesadas do álcool, tudo tinha abrandando a um ritmo quase sobrenatural e, apesar de tudo ter começado a parecer melhor, não conseguia tirar Lori da cabeça! Queria que ela desaparecesse, queria estalar os dedos e vê-la evaporar-se no ar, queria ser feliz junto do homem que amava. Segundo Jelle ela acabaria por se ir embora, ia voltar para Espanha após terminar a faculdade… Mas admitamos que isso não iria propriamente acontecer no dia seguinte! Recordei-me inevitavelmente de uma conversa que tinha tido com Jelle umas semanas atrás.
Ambos estávamos sentados no sofá, os braços dele prendiam-se à volta dos meus ombros.
“Amo-te…” sussurrara ele ao meu ouvido. “Também te amo meu doce… Diz-me uma coisa… Quando é que vou deixar de te partilhar com a Lori?” dissera eu fitando os seus grandes olhos azuis. “Esse dia está quase a chegar linda…” respondera ele, finalizando após um beijo “Eu largaria qualquer coisa por ti!” “Asério?” se não estivesse tão cega ter-me-ia surpreendido com a minha própria ingenuidade. “A sério meu amor…” ele afagava-me o cabelo enquanto me beijava o pescoço…
O resto da memória já estava turva, aliás, já tudo era turvo à minha vista, mirei pela janela. O rio Amstel corria perante os meus olhos numa rapidez fugaz, via as árvores agitadas serem chicoteadas pelo vento violento. Na minha cabeça as cores já se misturavam, os salpicos florais que repousavam no leito do rio não eram mais que meros pontos na tela distorcida que era a minha mente. Os meus olhos ameaçavam fechar. Recuei uns passos e tombei no sofá, imóvel. Apaguei…
Comecei a ouvir um barulho ao longe, a chamar-me, a arrastar-me lentamente para a realidade. Tinha caído num sono profundo por efeito do álcool, olhei para o relógio, não tinha dormido mais de duas horas e acordei com a campainha a tocar. Levantei-me relutantemente, deambulei até à porta arrastando os pés pelo chão. Bateram à porta.
“Aaghie…?” ouvi chamar do lado de fora da porta. Era a voz do Jelle… Estremeci perante a minha conclusão.
Esforcei-me por ficar, ou ao menos parecer, sóbria o suficiente para encarar Jelle apesar de ainda sentir a cabeça a latejar. Abri rápido a porta e ele entrou de rompante. Fechei a porta atrás dele e mirei-o de alto a baixo, aparentemente ele estava a fazer o mesmo. Pisquei os olhos num segundo e no outro estava a sentir o calor do corpo dele contra o meu, os seus braços envolviam-me carinhosamente num abraço apertado.
-Eu não te ando a evitar bebe. – sussurrou ele ao meu ouvido. O meu coração falhou uma batida e senti um arrepio percorrer-me as costas.
-Não atendias… Pensei nisso… Desculpa ter ideias tão parvas! E desculpa ter ligado à Lori… - Ele afagou-me a cabeça e pressionou-a contra o seu peito. – Desculpa… - murmurei novamente.
-Shhhhh… Já passou meu amor. – ele encaminhou-se para o sofá e sentamo-nos, recostei-me entre os seus braços.
-Amor? – ele acariciava-me a cara de um modo doce e suave que me transportava para outra dimensão, isso mais o efeito do álcool começava a deixar-me numa espécie de transe.
-Sim Aaghie…

Limites da Obsessão [Parte1]

Finalmente os dias haviam melhorado, tudo estava com mais cor… Não sei se isso se devia a chegada tardia da Primavera, já em meados de Abril, ou ao facto de estar de volta ao sítio onde tudo na minha vida tinha começado. Amesterdão fora o inicio e seria o final da minha vida. Ao menos queria acreditar que assim seria, que mesmo que viajasse para longe e fizesse a minha carreira noutro lugar iria voltar, no leito da minha velhice para mais uma vez ver as túlipas a desabrocharem junto aqueles moinhos tão serenos. Passaram dois anos desde que tinha partido para Nova York, exactamente dois anos, nem mais nem menos… Fiz um mestrado na minha área de design e estava só à espera da minha oportunidade para iniciar a minha carreira. Continuei a minha caminhada pela beira do rio, as árvores eram as mesmas, as casas eram as mesmas… as pessoas eram tão diferentes, nem uma cara conhecida no meio daquela multidão apressada num compasso irritantemente alegre. Naquela altura em que estava de volta ao sítio que detinha toda a minha alma nada me impediria de ser feliz…
*Piiiiiiiip… Piiiiiiiiiiip*
“Chegou à caixa de correio de…”
Apressei-me a desligar o telemóvel assim que este chegou ao voice mail… Ele já devia ter no mínimo cerca de sete chamadas minhas. Pus o telemóvel de parte e sentei-me no sofá mirando a cidade pela janela. Nunca me cansava de galar a paisagem com os olhos, devorava cada cor, cada sensação com uma tentadora malícia de desejo, procurando tirar partido de todos os meus sentidos e experiências. Naquele momento encontrava-me num pequeno apartamento no centro de Amesterdão, tinha apenas um quarto, uma cozinha, uma sala… Enfim, tudo o que eu precisava para ter uma vida dentro das minhas expectativas. Algo que a minha mãe não compreendeu, mas que para mim parecia bastante óbvio, era o meu desejo de independência após o estágio no estrangeiro, queria retomar a minha vida, ou melhor, começar uma vida nova, longe de problemas, onde me pudesse sentir realizada e feliz.
Peguei novamente no telemóvel e voltei a inevitavelmente marcar o número dele…
-Atende Jelle… - murmurei impaciente.
“Chegou à caixa de correio de… Jelle van Heck” – Estremeci ao ouvir o nome dele. “Deixe a sua mensagem a seguir ao sinal”
Fui apoderada pela indecisão… Deveria deixar mensagem ou não? -Olá Jelle… Sou eu, a Aaghie… Como não disseste mais nada eu fiquei preocupada! Liga-me assim que ouvires esta mensagem. Bem… Eu até já telefonei à Lori… Ela disse que tinha falado contigo…- fiz uma pausa enquanto raciocinava. – Andas a evitar-me Jelle? Desculpa a pergunta… Foi algo estúpido! Depois liga. Beijos! – desliguei o telemóvel. Odiava-me a mim mesma naquele preciso momento, não queria ter cedido daquela forma! Arrependi-me da mensagem de voz no segundo a seguir a ter desligado a chamada. Perguntava-me que iria ele pensar de mim depois de ouvir que até à Lori havia telefonado?! Levantei-me e percorri o chão de madeira envernizada da sala até à cozinha, algo estava bastante errado comigo, tão errado que parecia estar certo. Eu não tinha noção dos acontecimentos à minha volta por isso continuava feliz no meu mundo cor-de-rosa. Tirei do frigorifico uma sisuda garrafa de vinho verde, verti-o para um copo de pé alto e deambulei outra vez até à sala, caminhei até a janela e fiquei a fitar a paisagem. Encostei a anca à ombreira da janela rasgada até ao chão e por mais que tentasse não conseguia parar de pensar no Jelle, era como uma cicatriz na minha cabeça, uma memória vincada que teimava em permanecer pelo simples prazer de me atormentar. Dei mais um trago de vinho e comecei a questionar-me outra vez, de uma forma frustrada e derrotista, o porquê de ter falado sobre a Lori naquela mensagem. Aliás, a situação mais preocupante não era o facto de a ter mencionado, mas sim ter efectivamente falado com ela. Essas minhas acções precipitadas deixavam-me ainda mais furiosa comigo mesma. Após ter acabado aquele copo de vinho, fui até à cozinha propositadamente para o encher outra vez…

Sem Nome

Passou exactamente 10 anos desde que te conheci. Doce veneno que os meus lábios teimam incessantemente em provar cada noite que passa. Sempre achei engraçada a forma permanente que “o amor” ganhou quando saído do teu coração, aquela forma obscura e tempestuosa que só se da a conhecer quando já se provou o interior, quando já se chegou ao caroço, tal qual um pêssego demasiado maduro caído duma árvore numa tarde de Outono. Apodrece por dentro mantendo o sumarento aspecto dourado perante os olhos alheios. Alguém, na sua ingenuidade apaixonada, o colhe do chão onde padece e o guarda no regaço, despojando-se de outros frutos para preservar o delicioso pêssego pintado com as cores do Sol. A doce camponesa, na ignorância da tenra idade, leva-o para casa, acolhe-o e prepara-se para o provar. Num remoinho de sensações, o doce aroma e o virtuoso aspecto induzem em erro quem de olhos fica preso em tal tesouro. (…)

Limites da Sedução [Parte 3 - FIM]

-Uma hora. – repetiu Akira para me fazer entender que se dentro do tempo estabelecido não estivesse na rua seria mau para o meu lado….
-É assim que cumpres o que dizes? – comecei sem controlo na voz. – Quando prometeste que estarias sempre comigo, que me acolhias em tua ca…
-Nem continues! – gritou ele. – Não acabes essas frases Kaori, olha que ainda te podes vir a arrepender delas. O teu irmão está morto, tu és maior e vacinada e agora faz-me um favor e põe-te a andar desta casa! Desaparece de uma vez… - a agressividade da voz voltara e eu sentia-me outra vez prestes a sucumbir… como podia alguém ser tão frio, tão insensível…
Akira agarrou no seu casaco e saiu do meu quarto com uma rapidez alucinante, a raiva que agora sentia era a mistura do que eu lhe dissera com as suas próprias decisões… Encostei-me a parede e deslizei, deixei-me cair até embater no chão, puxei as pernas ao peito e não consegui evitar as lágrimas, aquelas pérolas transparentes que me caiam cada vez que ele me magoava, estava com dificuldade a respirar e doía-me a cabeça de tanto barulho a que tinha estado exposta. Estava num daqueles momentos em que o mundo parecia cair-me em cima, onde apenas a solidão consolava o meu coração que gritava em espasmos ritmados o nome dele… Respirei fundo, teria de ser mais forte! Ver para além do que os olhos me mostravam, sonhar para além da minha consciência… Limpei as lágrimas e fitei a lua que se erguia alta no céu, observei-a algum tempo no silêncio obscuro da noite e só me levantei quando ganhei forças para começar a fazer a mala… Iria ser mais forte que isto!
Penosamente retirava todos os meus pertences, que não eram muitos, das gavetas, armários e prateleiras, limitei-me a preparar apenas roupa para levar, também tinha as minhas estratégias e um dia ainda voltaria para aquela casa, um dia seria ele a sucumbir a mim, um dia seria ele a morrer de desejo de me tocar… Não sei quando mas um dia…
Passara uma hora e tudo o que me pertencia e me fazia falta estava arrumado dentro da mala, preparei-me para sair… Caminhei até a porta da saída e na sala vi o Akira à janela, observando algo com um olhar distante, fixei-o de modo a chamar a sua atenção mas sem sucesso, ele apenas olhou com a alma vazia e fria, digamos congelada, e voltou novamente os olhos para a janela. Sentia-me tão frustrada! Como se estivesse a perder uma batalha, totalmente humilhada, fracassada… Sem qualquer alegria. Abri a porta num ápice e fechei-a atrás de mim com força, como se estivesse a descarregar tudo nela, como se libertasse toda a minha raiva, toda a minha fúria e consequentemente toda a minha tristeza. Sai a porta do prédio e foi nessa altura que comecei a vaguear sem destino pelas ruas de Tóquio. Ainda era assolada por várias preocupações, e, mais grave ainda, por imagens do Akira ao meu lado. Imagens dele do género de flashback a passar na minha mente e a torturarem-me com aquelas memórias que tanto me seduziam…
Observei o meu relógio… Uma da manhã… Nesta altura comecei a pensar onde iria passar a noite, em que beco escuro, em que vão de escada, ou debaixo de que ponte… Nesta altura comecei a ficar seriamente preocupada com o sitio para onde ia…

Limites da Sedução [Parte 2]

-Mas… - tentei contrapor.
-Shhhhh. – Fez-me sinal de silêncio. – Não tens razão, não tentes ganhá-la quando não a tens… Sabes? Poderia dizer que eras apenas mais uma peça vulgar mas aí estaria a rebaixar-te ao nível dos outros, és mais do que isso, és a rainha deste jogo de xadrez e com as tuas atitudes, com as tuas “jogadas” quase punhas o rei em xeque!
Uma lágrima solitária rolou-me pela face, quando o sermão cessou, e parou na mão dele, nem sei porque chorava… Seria este o peso da desilusão? A culpa que sentimos quando desiludimos alguém de que gostamos tanto… Sem nenhum aviso, sem qualquer tipo de sinal senti a mão dele a aproximar lentamente a minha cara e passado uns segundos tive o prazer de sentir os lábios de Akira colados aos meus… O meu coração acelerara e todo o meu corpo se aqueceu, os lábios dele estavam tão quentes… tão doces… tão apaixonantes... e eu estava tão presa a ele… Ele beijava-me duma maneira que me seduzia, me tirava as forças e colocava totalmente a sua mercê. Mas perguntava-me… Que pretenderia ele com aquilo?
Levou a boca ao meu ouvido e murmurou numa voz sedutora tão própria dele:
-Faz as tuas malas. Tens uma hora para deixar esta casa…
Ele permaneceu agarrado a mim, com uma mão na cintura e outra na nuca, enquanto eu estava em choque! Esperava ouvir outra coisa, outras palavras com outra sonoridade, mas quando ouvi aquelas o meu coração falhou uma batida e quase ameaçou saltar-me do peito, senti-me atordoada, tonta… Estava a ser expulsa de casa pelo rapaz que um dia dissera proteger-me, pelo rapaz que um dia dissera não me deixar sozinha após a morte do meu irmão, pelo mesmo rapaz que estava agora mesmo a minha frente agarrado a mim num misto de prazer e sedução.
-O quê? – interroguei ainda prisioneiras dos seus braços.
-É exactamente o que ouviste… - continuou em voz calma e sensual, tentando enrolar-me em cada palavra, como só ele sabia fazer. – Se não saíres serei obrigado a tomar… - hesitou um pouco. – medidas mais drásticas.
Algumas lágrimas teimavam em vidrar-me os olhos mas tinha de ser forte… Não podia mostrar o quão dependente estava.
-Mas… Mas… - tentei expressar algo que mostrasse o meu desagrado, a minha discordância mas estava totalmente bloqueada… Aquela seria uma jogada inteligente, uma jogada perfeita, se não fosse contra uma peça do mesmo campo de batalha. – Para onde irei? Não tenho casa… Vais-me deixar na rua? – esforcei-me para demonstrar o meu desespero.
-Para onde vais? – repetiu ele com um certo tom irónico. – Não sei nem me interessa querida. – sussurrou ao meu ouvido antes de me largar e se afastar.
Deslocou-se até a outra ponta do quarto, ao pé da porta, e parou para me mirar mais uma vez.